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No próximo mês de novembro, a cidade de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, será a sede da 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, ou simplesmente COP28, o evento em que representantes dos países-membros da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) estarão reunidos para discutir questões ambientais urgentes e de importância global. O presidente desse grande encontro, Sultan Ahmed Al Jaber, já defendeu que o mundo, além de reduzir as emissões, deve usar novas tecnologias para retirar o excesso de carbono que joga na atmosfera e, assim, frear o aquecimento global. Na foto acima, homem caminha em dia de calor extremo na Holanda.
Claudio Oller, professor titular do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica (Poli) e coordenador do Laboratório de Alta Pressão, na Universidade de São Paulo (USP), inaugurado no ano passado, compartilha dessa ideia: “os processos de captura e transformação de dióxido de carbono (CO2), principal causador do aquecimento global e das mudanças climáticas, precisam ser atualizados.” E esse é um dos objetivos do laboratório gerido pelo professor, que faz parte do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI, na sigla em inglês): encontrar novas opções, mais sustentáveis e econômicas, fazendo uso de recursos químicos e biológicos sob alta pressão.
Foi a partir da Revolução Industrial, no século 18, que a utilização de recursos fósseis, como carvão, gás natural e produtos derivados do petróleo, incluindo gasolina, óleo diesel e óleos combustíveis, entre outros, aumentou consideravelmente. O uso desses recursos libera gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Isso também acontece quando florestas são derrubadas para a expansão agrícola: o carbono, que estava armazenado na forma sólida nas biomassas vegetais, é liberado em forma de gás quando a vegetação é queimada.
Tempestade em passagem por Nova York: o clima muda
De acordo com os dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), nos últimos 270 anos, a humanidade liberou cerca de 1,5 trilhão de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera. Essas emissões funcionam como uma tampa, que aprisiona o calor no planeta. Esse fenômeno está acelerando o aquecimento global, resultando em desastres ambientais de larga escala, como alterações nos ventos atmosféricos, nas correntes oceânicas e nos regimes de chuva em todo o mundo. Como consequência, o mundo vive ondas de calor extremo, secas prolongadas, acidificação das águas oceânicas e aumento do nível do mar, ameaçando ecossistemas e comunidades costeiras. O CO2 é acusado de ser o principal causador do efeito estufa, não porque pode reter mais calor, mas porque existe em maior abundância do que os outros gases, como o metano, o óxido nitroso e o próprio vapor de água.
Na opinião de Oller, a humanidade ainda vai depender do petróleo e seus derivados por muitos anos, – “vou chutar uns 50 ou mais” -, já que ele é o principal combustível fóssil usado no mundo e para o qual ainda não foi descoberto um substituto equivalente. “O petróleo é maravilhoso, e é matéria-prima para milhares de outros produtos. É um desperdício queimar esse tesouro“, afirma. Sob o comando do professor, os pesquisadores estudam a “Bioconversão de CO2 no estado supercrítico por bactérias da Antártica”. Nos trabalhos com sedimentos retirados do fundo do mar Antártico, ricos em microrganismos, os cientistas conseguiram despertar uma bactéria adormecida há cerca de 20 mil anos. Agora, eles querem saber como esses microrganismos se comportam em condições extremas: “com grande variação de pressão, sem claridade e na presença de um CO2 em estado supercrítico, que é uma condição especial entre o gasoso e o líquido, conseguido por meio de alta pressão”, diz Oller.
Essas tais “condições extremas” são encontradas no mar, em cavernas subterrâneas, como as que vão surgir com a exploração do pré-sal. A proposta é estocar ali o CO2, oriundo da produção de petróleo, em estado supercrítico para que ocupe menos volume nas cavernas de sal. Oller afirma que essa é uma das maneiras mais eficazes de reduzir a emissão de gases de efeito estufa, mas alerta que “ainda não sabemos as consequências que esses reservatórios de carbono podem provocar ao meio ambiente, em longo prazo, sem falar que há risco de vazamentos”. Segundo o professor, a bactéria despertada se alimenta de CO2, “e adora!”. Então, no futuro, a ideia é injetar esses microrganismos ressuscitados nas cavernas marítimas e aguardar a mutação do carbono de estado supercrítico para o sólido. “Esse processo também pode dar origem a outros produtos, como álcool ou hidrocarboneto. Estamos estudando a viabilidade científica e econômica dessa ideia.”
Brandini: mar é um aliado
Mas o mar tem muito mais a oferecer do que cavernas para estocar carbono. “O mar é aliado na redução das emissões de CO2, pois pode gerar energia limpa além de fornecer matéria-prima para combustíveis renováveis”, defende o oceanógrafo Frederico Brandini, que vê nas marés, correntes, algas e nos ventos oceânicos soluções para mitigar o efeito estufa. “Na zona costeira, há um leque de alternativas para resolver a crise energética e reduzir a nossa dependência de combustíveis não renováveis. A mais usada atualmente é a eólica. Mudar nossa matriz para energias alternativas é possível. Deixar de beber água e produzir alimento, não.”
Historicamente, ele explica, os oceanos desempenham o papel de absorver o excesso de dióxido de carbono da atmosfera, mas há um ponto de saturação. “Se essa tendência continuar, os oceanos atingirão sua capacidade máxima de absorver CO2 e vão começar a liberar esse gás de volta para a atmosfera.”
Expedição dos Schurmann: sobre a ação do homem no mar
A Família Schurmann, que vive em um veleiro há quase 40 anos, está na quarta volta ao mundo na expedição “Voz dos Oceanos”, cuja missão é produzir conteúdo sobre a ação dos homens nos mares. A primeira etapa da viagem será concluída em novembro, quando chegam à Nova Zelândia. Os velejadores lembram que os oceanos são grandes pulmões do planeta: respondem por mais de 50% do oxigênio respirado. Além de contribuírem com a produção de oxigênio na Terra, o fitoplâncton armazena 25% – no mínimo – do CO2 emitido por combustíveis fósseis queimados pela espécie humana.
De acordo com o professor Brandini, a energia eólica é a que tem sido mais explorada nas zonas costeiras, com seus parques espalhados entre a costa e mar adentro. “Mas o mais estável e previsível dos processos oceânicos com potencial para extração de energia elétrica é a circulação diária das marés.”
Existem basicamente duas possibilidades de extrair energia das marés: usinas de barragem e turbinas subaquáticas. A primeira é formada por uma barragem com turbinas numa base que aproveita a variação do nível da água do mar causada pelas marés para produzir energia, chamada de maremotriz. “A primeira usina desse tipo foi construída em 1966, e ainda funciona no estuário do rio Rance, na França, com capacidade de produzir 240 MW.”
Brandini admite que, apesar de boa, a ideia apresenta problemas. “O maior deles é o impacto ambiental decorrente da construção da barragem em regiões estuarinas. No Brasil, seria uma catástrofe do ponto de vista ambiental e socioeconômico.” Ele acredita que a tecnologia mais apropriada para obtenção de energia das marés seria a instalação de turbinas subaquáticas. “Elas funcionam como moinhos de vento, mas são submersas e captam a energia das correntes geradas pelos ciclos de maré. Cada unidade gera entre 750 e 1500 KW, dependendo da corrente local”, explica o professor. Ele também conta que “há projetos de extração de energia diretamente do movimento das ondas na superfície, ou das variações de pressão em subsuperfícies decorrentes do movimento ondulatório no mar, vêm sendo investigados na Escócia, Canadá, Austrália, África do Sul e Estados Unidos”.
Biodiesel de microalgas marinhas: barato e renovável
Outros estudos indicam que há muita vantagem de produzir biodiesel a partir de microalgas. “São vegetais unicelulares que não usam água doce, podem ser cultivados em tanques flutuantes no mar, sem conflitos agrários, e usar nutrientes de fontes oceânicas, desde que as águas profundas – ricas em nutrientes – sejam bombeadas até a superfície. Nada que um pouco de tecnologia e vontade política não resolvam“, acredita Brandini.
Microalgas têm eficiência fotossintética muito maior do que os vegetais terrestres, com crescimento e acúmulo rápido de biomassa vegetal. Ou seja, produzem mais por hectare em menos tempo. “Elas também são eficientes fixadoras de carbono atmosférico. Estima-se que cada tonelada de biomassa algal consome duas toneladas de CO2 através da fotossíntese. Isso significa de dez a vinte vezes mais do que é absorvido pelas culturas oleaginosas.”
Planeta plástico
A Família Schurmann alerta para o aumento, nos últimos anos, na quantidade de plástico encontrada nos oceanos, em todas as partes do mundo. “De acordo com um relatório das Nações Unidas, ‘Da Poluição à Solução: Uma Análise Global sobre Lixo Marinho e Poluição Plástica’, até 2040, a estimativa é que os mares recebam entre 23 e 37 milhões de toneladas de plástico por ano. É uma quantidade absurda de resíduos. É importantíssimo compreender que não existe ‘jogar fora’”, informou para a ANBA a Família Schurmann.
“Quando a gente se depara com dados tão alarmantes e, principalmente, testemunha o que está por trás desses dados… nossa… a gente fica sem ar. Mas, com a Voz dos Oceanos, estamos em busca de soluções.” Em dois anos de jornada, a Família Schurmann também conta que encontrou “centenas de pessoas, ONGs e iniciativas atuando em diversas frentes de trabalho, capazes de minimizar o impacto da invasão de plástico nos oceanos e suas consequências na saúde do planeta”.
“O mar é uma esperança futura de produção de energia limpa”, acredita Brandini. Para o professor Oller, que segue pesquisando alternativas para dar um destino diferente ao carbono, que não a atmosfera, já temos em uso a tecnologia mais eficiente, atualmente, e que já foi testada e aprovada: o etanol. “Ele é o único combustível economicamente viável”, garante.