A participação do Brasil no mercado de carbono encontra barreiras como a baixa maturidade do país no setor e a regulação, mas também representa uma oportunidade, já que é grande a capacidade nacional de geração de créditos. É o que aponta um estudo feito pela Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil) e a consultoria WayCarbon. O levantamento projeta que na próxima década o Brasil pode suprir até 48,7% da demanda global do mercado voluntário do segmento e até 28% da demanda global do mercado regulado no âmbito das Nações Unidas.
O estudo foi divulgado ao público na semana passada, em evento na sede da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, na capital paulista, promovido pela entidade e a ICC Brasil, com a presença de cerca de 80 pessoas. O encontro antecede a 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP27), a ser realizada no Egito de 06 a 18 de novembro.
“O mercado de carbono é uma ferramenta de transição extremamente importante que vai permitir que os países comecem a colocar metas de redução de emissão, que premia as empresas que já conseguiram fazer essa transição e que ajuda as empresas que ainda vão ter um trabalho mais complexo a fazer isso dentro de um tempo aceitável. Quanto mais pudermos pensar em ferramentas que aliam a parte de sustentabilidade com a viabilização econômica dessa transição, isso é importante”, disse a diretora executiva da ICC Brasil, Gabriella Dorlhiac.
O estudo
A WayCarbon é uma consultoria que oferece soluções relacionadas à mudança do clima e ESG. Sua gerente técnica de Mudanças Climáticas, Laura Albuquerque, apresentou remotamente o estudo que teve como base a regulamentação do Artigo 6º do Acordo de Paris, definida na COP26.
O Artigo 6º prevê a comercialização de créditos de carbono excedentes, resultantes de medidas de mitigação para o cumprimento das metas dos países, chamados Resultados de Mitigação Transferidos Internacionalmente (ITMO, na sigla em inglês); a criação do Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (MDS) para a certificação de projetos de créditos de carbono; além de financiamentos, transferência de tecnologia e capacitação neste setor.
Albuquerque falou sobre as principais dificuldades para a atuação no mercado de carbono nacional. Entre elas, barreiras mercadológicas, como a alta complexidade dos projetos e a baixa maturidade do mercado; barreiras técnicas, como a baixa capacitação da mão de obra e a falta de metodologias adequadas; barreiras políticas, como a falta de credibilidade dos compromissos governamentais e a baixa representatividade nos espaços de tomada de decisão; barreiras regulatórias, como insegurança jurídica e a alta complexidade legislativa e tributária; e barreiras econômicas, como a dificuldade de acessar fontes de financiamento e incertezas quanto à demanda.
Entre as oportunidades para atuação no mercado de carbono nacional para os atores da oferta, Albuquerque colocou a internacionalização do mercado brasileiro, considerando grandes números estimados de capacidade de geração de créditos; aumento da demanda com compromisso de indústrias com metas baseadas na ciência, ou por licitações para a aquisição de créditos; exploração de novas frentes a serem regulamentadas internacionalmente. Para o governo brasileiro, esta pode ser uma oportunidade de alavancar estratégias de monitoramento de resultados.
O estudo propõe recomendações ao governo brasileiro. Que o poder executivo federal desenvolva e divulgue um plano para cumprimento da Contribuição Determinada Nacionalmente (NDC, na sigla em inglês) e os compromissos de zerar o desmatamento e reduzir a emissão de carbono; após o planejamento para a NDC, estabelecer a estratégia de venda de créditos por meio dos mecanismos de mercado do Artigo 6º, considerando usar os créditos de projetos mais complexos e seu potencial como fornecedor de créditos de Soluções baseadas na natureza (SBN).
Recomenda também a responsabilização do Comitê Interministerial Sobre Mudança do Clima e Crescimento Verde na agenda dos mercados de carbono; Incentivar e apoiar o desenvolvimento de metodologias que considerem a realidade climática do país; trazer definições claras para as Unidades Federativas sobre projetos jurisdicionais e procedimentos para implementação; e investir em SBN, que deve garantir o benefício máximo quanto à sustentabilidade e regeneração, além de minimizar danos sociais e ambientais, priorizando projetos que envolvam o plantio de florestas.
O que é o mercado de carbono
O mercado global de carbono consiste na comercialização de créditos de carbono que podem vir de projetos de reflorestamento, produções de energia limpa, entre outras ações, e vendidas a quem precisa compensar emissões, tornando seu negócio mais sustentável. Um país que tenha reduzido a emissão dos gases que geram o efeito estufa para além de suas metas pode, com essa ferramenta, comercializar seu excedente.
No Brasil, já existe um mercado voluntário de carbono, que se destaca na produção de biometano para substituição de diesel, hidrogênio verde e energia eólica offshore.
Foi publicado um decreto em 20 de maio deste ano para regulamentar o mercado de baixo carbono no País. O documento estabelece procedimentos para a elaboração de planos setoriais de mitigação das mudanças climáticas para diversos setores da economia e também institui o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa.
“O mercado de carbono é algo que precisamos alavancar não só do ponto de vista econômico, mas para acelerar a agenda ambiental no Brasil. Se não aproveitarmos essa janela de oportunidade, vamos ficar para trás”, disse Dorlhiac. A ICC Brasil terá um pavilhão na COP27.