Há um conhecido despacho, escrito em agosto de 1918 por Nilo Peçanha, então Ministro das Relações Exteriores. Ele permitiu que Maria José de Castro Rebello Mendes ingressasse naquele ano na carreira diplomática, tornando-se a primeira diplomata do país, mas com a ressalva “Não sei se as mulheres desempenhariam com proveito a diplomacia, onde tantos atributos de discrição e competência são exigidos”.
A citação de Nilo Peçanha, um retrato daquela percepção histórica, está na abertura do documentário “Exteriores – Mulheres Brasileiras na Diplomacia”. Dirigido por Ivana Diniz e com roteiro de Ana Beatriz Nogueira, é uma realização do Grupo de Mulheres Diplomatas, coletivo criado em 2013 e que reúne mais de um terço das diplomatas brasileiras.
O documentário de 53 minutos foi produzido como celebração do centenário de ingresso na carreira diplomática de Maria Mendes, que foi não somente a primeira diplomata brasileira, mas também a primeira mulher a prestar concurso público no país.
“Exteriores” só foi possível graças a um projeto coletivo de financiamento coletivo realizado no site Kickante, e a ajuda da Associação dos Diplomatas Brasileiros (ADB Sindical).
O debate sobre a presença feminina no Ministério das Relações Exteriores é feito no documentário a partir de uma grande riqueza de dados históricos, relatos biográficos, imagens de arquivo, depoimentos de mulheres diplomatas em vários estágios da carreira e tabulação de dados sobre mulheres na diplomacia brasileira.

Pesquisa
A parte histórica do documentário se beneficiou da pesquisa de Guilherme Friaça, publicada pela FUNAG: “Mulheres Diplomatas no Itamaraty, 1918-2011 – Uma Análise de Trajetórias, Vitórias e Desafios”(diponível aqui). Na obra, Friaça resgata a história das primeiras diplomatas, apresentando trajetórias até então invisibilizadas numa instituição onde o cânone costuma ser exclusivamente masculino.
A outra inspiração foi o documentário sobre as diplomatas francesas, “Par Une Porte Entreouverte”, produzido pelo Quai D’Orsay em 2017. Ele acendeu nas integrantes do Grupo de Mulheres Diplomatas o desejo de também apresentarmos ao público a nossa trajetória e os nossos desafios.
Mulheres na tela
Além de Maria José de Castro Rebello Mendes, a primeira diplomata, o documentário fala de Odette de Carvalho Souza, a primeira embaixadora brasileira e a primeira embaixadora de carreira do mundo, e de Maria Sandra Cordeiro de Mello, a primeira aluna do Instituto Rio Branco. O filme também trata da história de Mônica de Menezes Campos, a primeira diplomata negra, falecida precocemente em 1985 de um aneurisma cerebral. Aprovada em 1978, à época ela foi celebrada como símbolo e arauto de alegados “avanços” no Itamaraty – mas, depois, foi totalmente esquecida. No documentário, Diniz entrevistou a irmã de Mônica, Márcia de Menezes Campos.
As demais entrevistadas para o documentário são as embaixadoras Vitória Cleaver, Thereza Quintella, Edileuza Fontenelle, Maria Nazareth Farani, Eugenia Barthelmess, Irene Vida Gala, Sônia Gomes e Gisela Padovan; as conselheiras Marise Nogueira e Viviane Balbino; as secretárias Amena Yassine e Laura Delamonica.
O documentário está disponível gratuitamente na plataforma Vimeo.
* Adaptado do texto publicado originalmente por Bruno Carvalho, em Café História.
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