Em um encontro marcado pelo diálogo e pela diplomacia, o Embaixador da República Islâmica do Irã no Brasil, Abdollah Nekounam Ghadirli, recebeu jornalistas na manhã de quinta-feira (26) para um café da manhã na sede da embaixada, em Brasília. O evento teve como objetivo estreitar laços com a imprensa brasileira, esclarecer pontos sensíveis da política externa iraniana e reforçar a posição do país no cenário geopolítico global.
Durante o encontro, o Embaixador abordou a recente resolução aprovada pelo Parlamento Islâmico do Irã, já oficializada pelo governo e publicada por meio de seu presidente. A medida se baseia no artigo 60 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969), permitindo ao Irã suspender temporariamente certas obrigações, em razão de violações contra sua integridade territorial e ameaças a seus cientistas e instalações civis.
— Todas as questões em aberto relacionadas ao Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) estão sendo temporariamente suspensas para evitar mal-entendidos e esclarecer pontos pendentes — explicou Ghadirli.
A resolução reafirma a postura iraniana com base no artigo 4º do TNP, que orienta os próximos passos diplomáticos e técnicos em relação ao programa nuclear. O documento, já encaminhado ao governo, expressa o desejo de transparência e o compromisso com o direito internacional, desde que respeitada a soberania nacional.
Expectativas para a Cúpula do BRICS
O diplomata também revelou que o presidente do Irã poderá visitar o Brasil por ocasião da próxima Cúpula do BRICS, prevista para ocorrer ainda este ano. O país, que busca maior protagonismo dentro do grupo, vê o bloco como uma alternativa viável frente à crise de representatividade dos organismos multilaterais tradicionais.
— O BRICS tem um papel crucial na construção de uma nova ordem mundial mais justa e equilibrada. Não se trata apenas de declarações, mas de um esforço coletivo para superar as falhas estruturais do sistema atual — afirmou o Embaixador.
Ghadirli agradeceu formalmente ao governo brasileiro por ter condenado os recentes ataques contra o Irã, perpetrados por Israel e Estados Unidos, inclusive contra instalações de uso pacífico.
Reações a Trump e defesa do programa nuclear
Questionado sobre as declarações recentes do ex-presidente americano Donald Trump, que voltou a criticar o programa nuclear iraniano, o Embaixador foi enfático:
— Nosso programa nuclear é e sempre foi de caráter exclusivamente pacífico. Ele remonta ao período anterior à Revolução Islâmica, quando os próprios Estados Unidos sugeriram que o Irã desenvolvesse uma capacidade de 20 mil megawatts. O que mudou foi o contexto político, não o objetivo do nosso programa.
Segundo o diplomata, o programa nuclear iraniano permanece sob supervisão da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), em conformidade com os princípios do TNP. O Irã reafirma seu direito soberano de desenvolver tecnologia nuclear para fins civis, incluindo a produção de radiofármacos amplamente utilizados na medicina.
Ao criticar ameaças de ataques às instalações nucleares do país, Nekounam lembrou que tais ações configurariam grave violação ao direito internacional:
— É inaceitável que um regime que nem sequer faz parte do TNP — como o regime sionista — detenha armas nucleares e ameace outro país soberano com base em alegações infundadas.
Resiliência diante das sanções e postura de defesa
Ao comentar a política de sanções dos Estados Unidos, o diplomata iraniano afirmou que as restrições econômicas impostas ao país apenas impulsionaram o desenvolvimento autônomo de setores estratégicos e fortaleceram a resiliência interna do Irã.
— Nos últimos 300 anos, o Irã nunca iniciou um conflito. No entanto, temos o dever de responder com firmeza a qualquer agressão. Se formos atacados, faremos com que o agressor se arrependa — advertiu.
O Embaixador também mencionou a posição do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã, divulgada após o anúncio de cessar-fogo por parte de Israel, ressaltando que o país permanece em estado de alerta e pronto para reagir a qualquer nova ameaça.
Compromisso com a paz e rejeição às armas nucleares
Por fim, o diplomata reiterou o compromisso ético e religioso do Irã com a não proliferação de armas nucleares. Segundo ele, a doutrina do Líder Supremo, Aiatolá Ali Khamenei, proíbe expressamente o uso de armamentos de destruição em massa.
— Nosso enriquecimento de urânio tem finalidades pacíficas e humanitárias. Somos um país comprometido com a dignidade humana e com a paz entre as nações — concluiu.
O encontro reforçou o tom diplomático adotado pelo Irã, a disposição ao diálogo e a busca por parcerias estratégicas com o Brasil e os países do BRICS, num cenário internacional marcado por crescentes polarizações.