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Uruguai, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Bangladesh passaram a fazer parte do Novo Banco de Desenvolvimento dos BRICS (NDB, na sigla em inglês). O anúncio foi feito pelo presidente do NDB, o brasileiro Marcos Prado Troyjo.
“Os novos membros terão no NDB uma plataforma para fomentar sua cooperação em infraestrutura e desenvolvimento sustentável […]. Continuaremos a expandir o número de membros do Banco de maneira gradual e equilibrada”, afirmou Troyjo em comunicado divulgado em 2 de setembro.
De acordo com o presidente do NDB, a expansão do quadro de associados está em linha com a estratégia do banco de se posicionar como a principal instituição de desenvolvimento para economias emergentes.
A Sputnik Brasil conversou com Karin Costa Vazquez, professora da Escola de Assuntos Internacionais da Universidade O.P. Jindal, na Índia, sobre a expansão do banco e os planos do NDB para os próximos cinco anos.
Banco do BRICS
O NDB foi criado pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS, na sigla em inglês) em 2015. O banco do BRICS, como é mais conhecido, investe principalmente em economias em desenvolvimento em áreas como transporte, água e saneamento, energia limpa, infraestrutura digital, infraestrutura social e desenvolvimento urbano.
Nesses seis anos de operações, o NDB já aprovou cerca de 80 projetos, em um valor total de aproximadamente US$ 30 bilhões (cerca de R$ 155 bilhões).
Karin Costa Vazquez explica que o processo de expansão do NDB estava na agenda há muito tempo, praticamente desde a idealização do banco e que sempre foi uma etapa muito aguardada.
“É um passo importante para o NDB realizar a sua vocação de ser um banco de desenvolvimento global […]. De forma prática, isso significa que a expansão da membresia também possibilita o banco a aumenta o capital subscrito, além de mobilizar capital adicional junto ao setor privado para o financiamento de infraestrutura e desenvolvimento sustentável. Da mesma maneira, além da mobilização de recursos adicionais, a expansão também possibilita que o NDB passe a investir em novos mercados e ajude esses novos países a resolver gargalos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável domésticos.”
Segundo o jornal Estadão, um quarto sócio, provavelmente da África, deve ser anunciado até o fim do ano. A partir de então é esperado que o banco aceite de três a quatro novos membros por ano, podendo alcançar um total de 20 membros nos próximos anos.
De acordo com os regulamentos internos do NDB, Uruguai, Bangladesh e EAU serão efetivados quando os países completarem seus processos internos e depositarem o instrumento de adesão.
Novos membros
O Uruguai é o primeiro país da América Latina a ingressar no NDB como novo membro. Azucena Arbeleche, ministra da Economia e Finanças do Uruguai, afirmou que o país vê no NDB “uma grande oportunidade de aproveitar a cooperação com seus países-membros, com o objetivo de alcançar uma integração internacional mais forte no comércio e nos fluxos de investimento transfronteiriços”.
Mustafa Kamal, ministro das Finanças de Bangladesh, garante que a adesão ao NDB “abriu caminho para uma nova parceria em um momento importante de 50 anos de nossa independência”. Troyjo, por sua vez, destacou o fato de Bangladesh ser uma das econômicas de crescimento mais rápido do mundo.
Karin Vazquez considera a adesão desses dois países “muito interessante” porque abre para o banco do BRICS a possibilidade de atuar em escala regional na América Latina e no sul da Ásia.
“Sendo Uruguai vizinho do Brasil e Bangladesh vizinho da Índia, isso dá a possibilidade de o banco financiar projetos binacionais em um primeiro momento e, em uma eventual entrada de outros membros nas regiões, projetos regionais de integração econômica, que inclusive é uma das áreas de prioridades na atual estratégia de cinco do NDB […]. A entrada desses países abre caminho para essa nova atuação do banco em escala binacional em um primeiro momento e regional em um possível segundo momento”, comenta a especialista.
Quanto aos EAU, ministro de Estado para Assuntos Financeiros, Obaid Humaid Al Tayer, considerou que o ingresso ao NDB “representa um novo passo para melhorar o papel da economia dos EAU no cenário global, especialmente à luz das grandes capacidades e conhecimentos que o país possui no apoio a projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável”.
A professora da Universidade O.P. Jindal afirma que EAU são um polo financeiro global, que pode expandir os projetos do NDB com o setor privado, além de que o país tem investido em projetos em linha com a agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), um plano com objetivos de desenvolvimento sustentável para garantir um planeta saudável e uma vida digna para as gerações futuras.
“[EAU] é um país que tem buscado de forma bastante ativa diversificar a sua economia. Fundamentalmente produtor e exportador petróleo, há alguns anos o país tem promovido o setor de serviços, inclusive muito em linha com a agenda 2030 da ONU […]. [Há ainda] a capacidade de mobilizar recursos nas praças financeiras globais e uma visão orientada para o desenvolvimento sustentável e infraestrutura que vai muito em linha com a visão e o mandato do NDB”, avalia.
No geral, Karin Vazquez julga que, estrategicamente, a escolha dos três primeiros sócios não fundadores do banco do BRICS indica uma lógica de expansão regional, com foco na conexão dos países-membros com o sistema financeiro internacional e um reforço na “lógica de integração inter-regional entre os países em desenvolvimento e a partir de países hubs, polos ou centros nodais que seriam os países originais, os países fundadores do banco”.
Importância do BRICS
A professora da Universidade O.P. Jindal recorda que mesmo antes da pandemia do novo coronavírus era estimado que as economias emergentes em todo mundo precisavam de cerca de US$ 2 trilhões (R$ 10,3 trilhões) em investimentos em infraestrutura por ano pelos próximos 20 anos para manter as taxas de crescimento da época.
Todavia, os bancos multilaterais, desde os anos 1990, e os bancos comerciais, principalmente depois da crise de 2008, diminuíram muito os investimentos em infraestrutura. O NDB preenche parte dessa carência, comenta Vazquez.
“Hoje o NDB vem suprir essa lacuna. Ele tem US$ 50 bilhões [R$ 258 bilhões] em capital subscrito e cerca de US$ 30 bilhões [R$ 155 bilhões] em empréstimos. Mas, claro, esses valores estão muito longe dos investimentos que são demandados pelas economias emergentes […]. Mas tão ou mais importante do que a capacidade do NDB em emprestar diretamente para os países, é o potencial que o banco tem em atuar como catalisador de financiamento. Por exemplo, ao mobilizar capital privado para projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sustentável.”
Karin Vazquez frisa também que o banco do BRICS empresta em moeda local, e isso é muito importante porque ajuda a reduzir a exposição dos países-membros a volatilidade cambial e crises sistêmicas.
A especialista sublinha ainda que o intercâmbio de experiências dos países-membros para construir novos modelos de financiamento para o desenvolvimento.
“A própria ênfase do banco em investimentos de infraestrutura está bastante ligada com as experiências de desenvolvimento de países asiáticos, e da própria China, que priorizou ao longo de sua história investimentos em infraestrutura como parte de uma estratégia mais ampla para integrar a [sua] economia na cadeia global de valor e aumentar a competitividade e promover o crescimento econômico.”
A professora da Universidade O.P. Jindal conclui destacando que NDB vai focar nos próximos anos na própria reconstrução dos países-membros no pós-pandemia, agregando a isso as mudanças que o mundo vem sofrendo nos últimos anos.
“Vejo que o lançamento da nova estratégia do banco, de cinco anos a partir do ano que vem, a reconstrução dos países no pós-pandemia, mais as transformações que o mundo tem passado, como a transição para a economia digital, transição para economia de baixo carbono, com cada vez mais países, inclusive os cinco países-membros, comprometendo-se a descarbonizar suas economias até 2050, 2060. Todos esses elementos dão ao NDB, no meu ponto de vista, uma oportunidade única para projetar uma nova visão para o financiamento, para o desenvolvimento”, finaliza.
* Publicado originalmente por Sputnik.