O longa-metragem “É Noite na América”, da artista e cineasta brasiliense Ana Vaz, foi exibido na noite de quarta-feira (10) no Festival de Cinema de Locarno, na Suíça. Neste novo trabalho, a diretora, que tem Brasília como eixo de construção e reflexão crítica de sua obra, segue com sua câmera uma série de animais que foram parar na capital federal, perdidos, depois de serem expulsos de seu habitat selvagem no Cerrado, tanto pela expansão urbana quanto pela violência do agronegócio.
“O peso da construção, dessa modernidade excludente, extrativista, é algo que assombra e acompanha meu trabalho desde o início”, disse Ana Vaz em entrevista à RFI. Ela recorda que todas as cidades modernas foram erguidas a partir da expulsão dos animais do espaço urbano. “Essa separação criou o princípio da modernidade, mas com o foco na proteção de apenas um certo tipo de humanidade”, critica Vaz.
A intensificação da destruição do Cerrado tem causado a fuga de espécies selvagens que nunca deveriam buscar refúgio nas cidades. São tamanduás, lobos-guará, jibóias, corujas ou capivaras que aparecem nos locais mais improváveis. Muitos são recolhidos ao Zoológico de Brasília.
Em seu filme, Ana Vaz busca o olhar animal como um olhar de perplexidade, “um olhar de confrontamento à edificação dessa modernidade que nós conhecemos, neste caso incorporado pela cidade de Brasília, mas que poderia ser muitas outras cidades”, explica a cineasta. O longa é um constante confrontamento com o olhar dos animais que nos olha, diz ela.
“Eu sempre procurei ler a topografia e a história da cidade a partir de perspectivas múltiplas que tentam descentralizar o olhar humano como o único olhar que traz significado e sentido para nossa relação com o mundo”, destaca a cineasta.