A embaixadora da República Árabe da Síria no Brasil, Rania Al Haj Ali, concedeu entrevista exclusiva ao Diplomacia Business.
A diplomata, que chegou ao Brasil este ano, é a primeira a liderar a missão de seu país em Brasília. Ela falou sobre sua trajetória diplomática, sobre o trabalho da embaixada, as realações bilaterais e o trabalho com a grande comunidade síria e seus descendentes, que vivem aqui.
Diplomacia Business: Conte-nos sobre sua trajetória na diplomacia.
Rania Al Haj Ali: Comecei minha carreira profissional no corpo diplomático há cerca de 25 anos, quando o número de diplomatas mulheres, na época, era pequeno em relação ao número de diplomatas homens e por isso a competição era forte para se provar o mérito, principalmente pela dedicação ao trabalho, melhorando capacidades e competências, ganhando experiência, desempenhando bem e com excelência as tarefas e trabalhos que me foram atribuídos.
Minha ambição, desde então, era me tornar uma diplomata que no futuro ocuparia o posto de embaixadora, representando meu amado país, a Síria, este país cuja história remonta a mais de 9 mil anos. A Síria é conhecida em todo o mundo como o berço das civilizações e religiões monoteístas e acredito que tenha contribuído para dar suporte aos meus esforços.
A natureza do trabalho contribuiu para dar suporte aos meus esforços para alcançar minhas ambições, para o qual fui designada pelo Ministério das Relações Exteriores da Síria, pois servi na Delegação Permanente da Síria junto às Nações Unidas, em Nova York, de 2000 a 2005, na Embaixada da Síria em Tóquio, de 2007 a 2012, na Missão Permanente da Síria junto às Nações Unidas e outras organizações internacionais em Genebra de 2016 a 2020.
Também servi na Administração Central em Damasco após o término do meu trabalho nas missões diplomáticas a que me referi, onde trabalhei em vários departamentos técnicos e políticos, incluindo o Departamento da Europa, o Departamento da Ásia e o Departamento de Organizações e Conferências Internacionais do Ministério das Relações Exteriores e Expatriados na Síria. Representei meu país, a Síria, em reuniões e conferências internacionais em países dos continentes da Ásia, África e Europa.
Acima de tudo, tive o grande apoio da minha família, especialmente o apoio da minha mãe, que Deus a tenha em sua misericórdia, foi o principal eixo que me ajudou a ter sucesso no meu trabalho e alcançar a minha ambição.
Diplomacia Business: A senhora é a primeira embaixadora mulher da Síria em Brasília. Como a senhora vê a ascensão das mulheres na diplomacia?
Rania Al Haj Ali: Em primeiro lugar, sinto muito orgulho de ser a primeira mulher embaixadora indicada por Bashar al-Assad, presidente da República Árabe da Síria, para representar a Síria junto à República Federativa do Brasil.
É uma grande confiança e responsabilidade que carrego no cumprimento da nobre missão que a liderança do Estado sírio me confiou, que é de estreitar as relações de amizade e cooperação entre a Síria e o Brasil, dois países amigos em todos os campos, bem como estreitar os laços da comunidade síria no Brasil com sua pátria-mãe, a Síria.
O aumento da presença das mulheres na representação diplomática de alto nível no corpo diplomático é uma prova da confiança do decisor nas capacidades e competências das mulheres que representam metade da sociedade e um indício de que as mulheres têm demonstrado, ao longo de muitos anos, a sua capacidade de representar seu país e realizar todas as tarefas atribuídas a um diplomata de alto escalão. Vale notar que as mulheres empenham um esforço redobrado em comparação aos homens na carreira diplomática, para provar seu valor e consolidar seu lugar no trabalho diplomático e político.
O aumento da representatividade de alto nível das mulheres no corpo diplomático é uma prova da confiança do decisor nas capacidades e competências das mulheres que representam metade da sociedade e um indício de que as mulheres têm demonstrado, ao longo de muitos anos, a sua capacidade de representar seu país e realizar todas as tarefas atribuídas a um diplomata de alto escalão. Vale notar que as mulheres empenham esforços redobrados, em comparação aos homens, para provar sua competência e solidificar sua posição na atuação diplomática e política.
Estou muito feliz de que, na Síria, a porcentagem de mulheres diplomatas atualmente esteja perto de 50% e isso é uma evidência do aumento da confiança dos tomadores de decisão nas capacidades das mulheres sírias no campo do trabalho diplomático. É muito importante frisar que o tomador de decisões na Síria, neste contexto e que é homem, tem um papel fundamental para que a relação entre o número de diplomatas mulheres e homens chegue a cerca de 50%.
Diplomacia Business: Como estão as relações Brasil-Síria?
Rania Al Haj Ali: As relações entre a Síria e o Brasil são importantes, pois são de profunda amizade histórica, visto que as relações diplomáticas entre os dois países foram estabelecidas no final dos anos 50 do século passado, após alguns anos da independência da Síria da colonização francesa, em 1944 e a evacuação do último soldado francês do território sírio em 17 de abril de 1946.
A embaixada da Síria foi aberta no Brasil no início dos anos sessenta do século passado e tinha sede na cidade do Rio de Janeiro e depois mudou-se para a nova capital Brasília no anos setenta do século passado. A Síria está empenhada em consolidar as relações bilaterais com o Brasil nos campos político, econômico, cultural e todos os outros e o trabalho se baseia no fortalecimento da coordenação e comunicação entre os dois países, em todos os níveis, nos temas de interesse conjunto.
Gostaria de ressaltar que o que fortalece essas boas relações entre os povos dos dois países amigos é a presença, no Brasil, de uma grande e influente comunidade de origem síria.
O Brasil tem uma ligação histórica com imigrantes sírios, que vieram cá no século XIX. Como a embaixada tem trabalhado com essa comunidade?
Rania Al Haj Ali: A presença de uma grande comunidade de origem síria no Brasil é motivo de grande orgulho para sua pátria, a Síria. Há décadas, está comunidade contribui para o desenvolvimento de seu país, o Brasil, e se integram ao seu belo tecido social, pois são brasileiros-sírios.
Tenho feito o possível para me comunicar com eles, onde quer que morem e estejam pelo Brasil, direta ou indiretamente, por meio de visitas. Visitei a cidade de São Paulo, no final de fevereiro passado e conheci várias atividades de expatriados sírios, visitarei outras cidades onde reside a comunidade síria. Também me comunico com a comunidade através dos quatro cônsules honorários da Síria no Brasil (nos estados de Goiás, Paraná, Santa Catarina, Mato grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais).
E também através de páginas de redes sociais, onde criamos uma página da Embaixada no Facebook e uma conta no Instagram, onde traduzimos as notícias e informações que são publicadas em árabe e português, inclusive com o objetivo de alcançar brasileiros interessados na questão síria. As portas da Embaixada da Síria em Brasília e do Consulado-Geral da Síria em São Paulo estão abertas a todos os sírios, inclusive para prestar-lhes serviços consulares.
Seu país enfrentou um terremoto recentemente e recebeu ajuda de outros países. Como está a situação hoje?
Rania Al Haj Ali: Os desafios enfrentados pela Síria e seu povo são enormes, pois a situação na Síria é muito difícil em termos de condições econômicas e de vida dos sírios, especialmente nas províncias que foram atingidas pelo devastador terremoto de 6 de fevereiro, onde teve efeitos e repercussões catastróficas, pois resultou em milhares de vítimas entre mortos e feridos e danos materiais muito grandes em propriedades públicas e privadas nas quatro províncias afetadas.
Deve-se salientar que a tragédia do terremoto agravou, sobremaneira, o sofrimento dos sírios, que já persistia há cerca de 12 anos, desde o início da crise síria, em decorrência das repercussões da guerra terrorista travada contra ela, da ocupação estrangeira de partes dos territórios sírios e a pilhagem de suas riquezas nacionais, especialmente petróleo e trigo, resultando em uma acentuada deterioração das condições econômicas e de vida dos sírios, agravada pelas repercussões da das medidas coercitivas unilaterais medidas impostas à Síria pelos países ocidentais, que são sanções ilegais e ilegítimas, de acordo com o Direito Internacional.
Gostaria de ressaltar que é muito importante a ajuda prestada à Síria e seu povo por parte dos países árabes e de países amigos ao redor do mundo, inclusive do Brasil e do povo brasileiro e de organismos internacionais.
O Governo sírio agradece a todos aqueles que solidarizaram-se com ele e apoiaram-no em sua provação durante o devastador terremoto, e agradece toda a ajuda prestada às vítimas do terremoto e para responder às suas desastrosas repercussões. No entanto, é importante notar que, apesar do que foi prestado até a presente data em termos de assistência, as necessidades são grandes e contínuas em consequência do sismo, pois são necessidades de natureza imediata, bem como necessidades a médio e longo prazo.
Existem necessidades em todos os setores, especialmente nos setores médico e de saúde, energia e transporte. Portanto, é importante continuar prestando assistência à Síria.
É muito importante notar que o Governo sírio empenhou e continua empenhando todos os esforços, dentro de suas possibilidades, para responder às repercussões do terremoto desde o primeiro dia de sua ocorrência. O governo também ofereceu grandes facilidades para viabilizar a entrega de ajuda humanitária às vítimas do terremoto e todas as pessoas atingidas nas províncias de Aleppo, Latakia, Idlib e Hama, sem discriminação.
Gostaria de frisar que a melhor forma de apoiar a Síria e seu firme povo, neste contexto, é acabar com as sanções unilaterais impostas a ela e da contribuição dos países amigos, liderados pelo Brasil, para o processo de reconstrução da Síria. Isso, por sua vez, alcança o interesse comum e o retorno benéfico para todas as
partes.